não não eu não preciso mais dormir eu sou calígula e incitatus cavalgando em direção a urano eu sou pancho villa stephen dedalus bento de albuquerque santiago raskólnikov afonso henriques de lima barreto rindo de seu próprio fígado no hospício eu sou o personagem omitido o livro não-escrito cortem a cabeça de todos os ídolos deuses e celebridades mergulhem toda essa gente supersticiosa em óleo fervente meu coração está inchado meu coração precisa explodir meu coração é uma bomba de tinta azul é preciso estourar as lâmpadas por pura diversão é preciso morder planetas como se fossem maçãs derreter o corpo é preciso ficar aqui dentro enquanto eles se matam lá fora enquanto eles trocam pâncreas por salários enquanto a nossa dor é anestesiada por raios catódicos é preciso arranhar com chaves de fenda sonhos na parede não é preciso porra nenhuma é preciso um grande cu negro que drene toda a galáxia todas as estrelas como um ralo de pia como o espaço que há entre os seres e entre nossas mentes como um significado que esquecemos mas não se esqueça eu sou uma metáfora a ser decifrada eu eu eu quantos eus sim eu sei e não me desculpo pelo exagero de eus porque afinal não importa se falo de mim de ti de todos nós quem lerá a última linha? quem atirará o primeiro montante de merda? quem ainda precisa de palavras? quem ainda precisa escrever? novos vírus novíssimos meninos cirróticos prontos para o ocaso o acaso o casaco que não nos protege do frio do ponto que nos anula da margem que não pode ser alcançada
cansado do massacre cotidiano saio em busca de contatos telepáticos e flores que possam ser dissolvidas em detergente ou sangue é preciso compensar a falta de luz é preciso exorcizar o mundo da eterna multiplicação do vírus do controle total de cada fração de movimento troca de energia tempo e espaço é preciso desmascarar a coincidência e o acaso é preciso derramar cores nos lagos da imaginação dançar com os fantasmas da infância sonhar com insetos devolver o corpo à terra derrubar ministérios eleger presidentes esquizofrênicos budas mendigos é preciso derrubar hospícios zoológicos farmácias supermercados tribunais delegacias é preciso gerar novos dionísios é preciso avançar no espaço fazer uma ode às coisas simples aos vegetais ao esterco ao ruído dos intestinos cheirar cocaína estudar geografia absorver a umidade dos becos fumar trezentos cigarros o sabor da nicotina calmamente o piano as teclas a cartela de calmante na estante o cérebro congelado a espinha dorsal a infelicidade que não se explica o dia o dia o dia as horas o relógio tudo o que poderia ser dito os policiais na esquina nosso medo nossas medidas é preciso continuar vivo rir do suicídio compreender a doença da filosofia o ridículo o sentido a matemática os logaritmos a heroína é preciso ajudar o cão agonizante a atravessar a ponte.