sexta-feira, 25 de julho de 2008

Fotografia: Armindo Dias







Acordou de súbito como se a noite de sonho fosse condenável, o corpo cansado não impediu que levantasse rapidamente e penetrasse o olhar entre as peças do mobiliário a espreita de alguma presença estranha, fitou cuidadosamente cada espaço vazio do cômodo e tudo lhe pareceu igual. Soltou um suspiro que mesclava tranqüilidade e desgosto e pôs-se a observar tudo que ali se mantinha íntegro. Tantos anos despertando no mesmo aposento, tantos anos as mesmas paredes, a mesma dignidade, a mesma loucura, o mesmo silêncio.

A identidade conquistada pelos extremos de conforto e estranhamento tende a assumir forma contrária ao que parece e comumente não se presta o cuidado apropriado até chegar ao ponto de se perder a lucidez do 'eu' essencial.

Ameaçou dirigir-se à janela, mas atirou-se brutalmente na cama, naquele momento nada lhe interessava mais do que a nulidade, nada que estivesse além de sua própria existência transmitia-lhe crédito. Existir ali não significava ofício, romance, amigos, ordem, bem-estar, sexo, jornais, televisão não significava porra nenhuma! Era só a inteira ausência de um sujeito coletivo, a cruel e efetiva realidade do homem. Todos os engodos se desintegravam na falta de palavras, na imobilidade dos gestos, na claridade do quarto e tudo era claro, demasiadamente claro.

— É a minha casa que tem várias moradas e não a do Pai de Outro. Veja a honestidade neste espelho, sou eu! Veja a mulher contente, o cachorro mijando, as crianças correndo, as abelhas copulando. Veja a insensatez da gente, o vizinho transando, o velho morrendo, a bailarina dançando! Veja o mundo inteiro, sou eu! nada existe além de mim, sou eu o tempo todo perambulando no concêntrico do Universo, um mundo todo ele 'eu' e ninguém mais existe que não passe por mim, pelo meu entendimento... Tudo isso é uma clausura intransponível, um vácuo biográfico, um distanciamento contínuo. Sou-me em igualdade de representação tal como és. Sou eu.
Funcionário é pego se masturbando e quebra escritório

NOTLIMAH AVLIS
da sucursal do Inferno, em São Paulo

Na tarde dessa sexta-feira, por volta das quatro horas da tarde, o auxiliar administrativo José Conrado, 33 anos, foi surpreendido por uma colega de trabalho que flagrou o rapaz se masturbando diante da tela do computador.

Ao perceber o rebuliço no escritório e ver o chefe falando com a polícia ao telefone, Conrado derrubou com chutes computadores, mesas, cadeiras e pilhas de papel. Com a chegada dos policiais ao local, e dada a ordem de prisão, o auxiliar administrativo abaixou as próprias calças, cuspiu na face do cabo Cornélio Silva e chacoalhou o membro zombando dos presentes, que prestaram depoimento no 4º Distrito Policial, no bairro da Consolação. “Ele era um cara muito esquisito; praticamente não falava nada com ninguém”, relatou uma das funcionárias da empresa de Telecomunicações, que não quis se identificar.

Em seu depoimento José Conrado culpou o tédio pelo ato. “Eu sou pago para ficar com a bunda sentada, sem fazer nada naquela porra a semana inteira”, gritou ao chegar na delegacia algemado. Ele responderá pelos crimes de agressão, atentado violento ao pudor, desacato à autoridade e danos à propriedade privada. Conseguimos uma entrevista exclusiva com o acusado:

– Qual a sua justificativa para o ocorrido?

Na verdade eu estava de saco cheio daquele trabalho. Tinha saído para o almoço, passei pela banca de jornal e vi aquela puta gostosa de salto alto na capa da revista... Como é mesmo o nome dela?

– Kamila Smaili, com K...

– Isso, isso...

– Você estava sob o efeito de alguma droga?

– Não.

– Por que resolveu se masturbar?

– Sei lá. Sei que voltei para a sala – estava com uma ereção filha da puta –, fiz a pesquisa na internet e encontrei meia dúzia de fotos da tal da Smaili. O resto você já sabe...

– Você é casado?

– Não, mas tenho namorada [risos]. E aposto que a essa altura ela está dizendo por aí: “Bem feito! Esse safado tem que se foder mesmo! Cretino!”. Ela nunca vai entender como uma punheta é importante para manter a saúde mental dos homens. Você sabe como são as mulheres...

– Há quanto tempo vocês namoram?

– Três ânus.

– E por que você decidiu quebrar tudo na sala?

– Eu poderia muito bem fazer um discurso contra o capitalismo, o trabalho, todas essas merdas, contra todos esses filhos da puta que enrabam o povo subnutrido, semi-analfabeto, mas... Quer saber? Fodam-se! Eu já estou completamente fodido! Volta lá para tua redação e apresenta essa matéria idiota para o editor [em um tom sarcástico]. Tudo isso é uma grande merda, tudo será esquecido e...

Nesse momento a entrevista é interrompida. Os policiais levam Conrado a tapas para uma das celas da delegacia.


terça-feira, 22 de julho de 2008

Um livro

O Instituto Pró-Livro lançou no fim de maio uma pesquisa intitulada Retratos da Leitura no Brasil. Chegaram à conclusão de que existem no país 95,6 milhões de leitores. Ou seja, 55% da população leu pelo menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa.

Um livro... O conceito de leitor foi bem definido: pelo menos um livro.

O governo deveria incentivar a produção de hai-kais. Um por página.

- "Dona Neide, precisamos de volumes grossos e leves, dona Neide. Mande o Afrânio aumentar a produção diária".

- "Afrânioooooooooo, espaçoooooo duplooooooooo"

"A transformação do ser humano se dá atrvés da leitura"

sábado, 19 de julho de 2008




Palavras-chave: caos cosmos arte


Comentários: 2008 D.C. - madrugada de sexta ou sábado - julho, 19


Esperma: -----º°º°º


Subtração: 8-8:

o futuro revelado em palavras suaves por um cientista técnico paranóico – visões proporcionadas pela tempestade – guarda-chuvas na tarde ensolarada – interferência das ondas de Júpiter na freqüência AM – o discurso do demônio – horário nobre da televisão - lampyris noctiluca extinta há mais de um século – orgia de mariposas em letras de néon – parasitas do sistema nervoso – fotografe minha dor enquanto eu vivo – subterrâneo sentimento subterrâneo carne alimento das larvas isto nunca terá um fim libélulas gigantes atravessam o céu da noite a mesma imagem do mesmo sonho eu não me lembro...

Notlimah avlis
foto e texto